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Poemas
Retalhos
Se um filho degenerado
Pode voltar a casa paterna,
Pedir perdão e um prato de comida,
Se um marido arrependido
Depois de inúmeros bordeis
Volta à esposa e aos filhos
Deixe-me gritar, Poesia,
Que estou aos pedaços.
Eu quero gritar a minha dor.
E que com ela façam coro
Todas as dores do mundo.
Eu quero gritar a minha angústia.
E que com ela façam coro
Todas as angústias do mundo.
Eu canto minha própria morte
E com ela todas as mortes
Quando eu disse que te amava
Não era primavera
E nem tão pouco eu trazia flores.
O sol de verão cozinhava nossos miolos
E como dois refugiados nos entregávamos.
O amor nascia,
Tenro rascunho de um grande poema,
Redondilha de sete cabeças e sete vidas.
Os políticos gritam!
Os críticos gritam!
Os generais gritam!
O clero dogmaticamente grita!
Deixem-me gritar o desconforto.
Morre o amor, medusa que se admira.
Atropelado na Rio Branco o amor morre.
Na fila do emprego, no supermercado.
No sindicato morre o amor.
Ainda jovem, sem gozar a vida o amor morre.
Pela liberdade
Pela luz
Pelos olhos que enxergam almas
Pela preservação da vida
Por todos nos
Foi-se a felicidade, doce coerência.
Foi-se a vida que inflava os meus pulmões.
Um sorriso em laços de fita, um dia,
Por ocasião de um aniversário
Ou no dia-a-dia pelo ânimo que é necessário
Hei de oferecer.
Mas deixem-me por hora gritar a solidão,
Que antes me amamentava e hoje me deserda.
Conta-se que o amor,
Como uma plantinha,
Deve ser regado, aparado e bem cuidado.
Pois danem-se os jardineiros!
Grita o meu amor de cactos
Espreitando o sol e a areia
Para tombar depois a golpes de machado.
Danem-se os jardineiros!
Grita o meu amor acompanhando a matilha
Com seus dentes e ossos
Para tombar depois na mira de uma bala.
O tempo...
Numa irremediável e violenta brisa cicatrizadora,
Há de nos redimir.
E o poeta renascido
Cantará o amor renascido,
Exuberante e imensurável.
Mas deixem-me por hora gritar
Que estou aos pedaços.